ARTIGO

O sabor dos 306 anos da nossa história

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*Kaene Almeida

No dia 8 de abril, Cuiabá celebra seus 306 anos de história, cultura e tradições. Entre tantas riquezas que fazem dessa terra um lugar singular, a culinária cuiabana se destaca como um dos maiores patrimônios da região. Mais do que apenas sabores e pratos, a gastronomia local carrega memórias, une famílias e conta a história do povo mato-grossense.

As lembranças da minha infância permanecem vivas. Ainda sinto o cheiro e o aroma delicioso das refeições, que reuniam a família em torno da mesa. Cada café da manhã, almoço, lanche da tarde e jantar era praticamente um evento, uma celebração da vida, do amor, da gratidão a Deus por nos permitir tanto.

Recordo-me com carinho da emoção de ir ao Mercado do Porto, onde hoje funciona o Museu do Rio, no bairro do Porto, e ver aqueles peixes enormes expostos. Escolher um belo pintado ou um pacu para a Semana Santa era um verdadeiro ritual, carregado de tradição e respeito pelas receitas que atravessaram gerações. A seleção do peixe certo nunca foi apenas uma questão de gosto, mas de identidade cuiabana. Afinal, quem é daqui sabe que cuiabano de verdade não come jaú!

Outra tradição que guardo com muito carinho na memória e sempre tento reviver, junto com a minha família e amigos, é o café da manhã, que em Cuiabá é um verdadeiro banquete para os sentidos. O cheiro do bolo de queijo frito, da broinha de São Benedito e do bolo de arroz se misturam e fazem do nosso “tchá com bolo” um verdadeiro deslumbre para os aromas com o chá de capim cidreira, o chá mate e o guaraná ralado.

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Sem falar no tradicional quebra-torto, uma herança dos costumes pantaneiros que aquece as manhãs cuiabanas com seu arroz de leite e farofa de carne seca, trazendo sustância e energia para o dia a dia. Assim como o escaldado de ovo, perfeito para dar força e vigor. Cada refeição matinal é um elo com o passado, um momento de encontro e partilha entre gerações.

E a gastronomia cuiabana também se revela nas refeições principais, com pratos como a Maria Izabel, a carne com banana verde, o revirado cuiabano, servido com pão e farofa de ovos com torresmo, a carne com mandioca. E, claro, com a peixada cuiabana, nas suas mais diversas formas, como a mojica de pintado, pacupeva ensopada, pacu seco com arroz.

E a tradicional cabeça de boi assada no forno de barro durante a noite toda, que até hoje é servida pela manhã, nas festas de santo do Distrito do Sucuri , sempre tão esperada.

E claro, não podemos esquecer da lenda que envolve a famosa cabeça de pacu. Dizem que quem a come nunca mais deixa Cuiabá. Se é verdade ou não, só quem prova pode dizer, mas é inegável que esse prato é um símbolo de pertencimento e coragem para quem quer se integrar à cultura local.

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E para os amantes do doce, nada mais perfeito que o piché, a paçoca doce cuiabana (farinha feita de milho torrado e moído, amendoim, açúcar e canela), o furrundu (mamão verde, rapadura e coco ralado), a banana frita servida com açúcar e canela ou a jacuba (água com farinha e açúcar).

Mais do que apenas alimentação, a culinária cuiabana é uma expressão de afeto e pertencimento. É ao redor da mesa que as famílias se reúnem, que os amigos se encontram e que as histórias são contadas. Cada receita tradicional é um testemunho do legado deixado por nossos antepassados, um presente cultural que precisa ser preservado e valorizado.

Por isso, é essencial que as novas gerações aprendam a cozinhar e a respeitar esses sabores tão autênticos. A manutenção dessa identidade gastronômica depende do compromisso de cada cuiabano em passar adiante os segredos culinários que fazem dessa cozinha um tesouro inestimável. Afinal, ser cuiabano de “tchapa e cruz” é carregar consigo a alegria de um povo festivo, receptivo e apaixonado pela própria cultura.

Que a celebração dos 306 anos de Cuiabá seja também um momento de valorização da nossa gastronomia, mantendo viva a tradição de sabores que unem corações e contam a história dessa terra tão rica e acolhedora.

*Kaene Almeida é cuiabana, gastróloga, nascida e criada no berço cultural da gastronomia cuiabana

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Adolescência sob o olhar da neurociência

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*Por Mariana Vidotto

A série Adolescência, da Netflix, é bem mais que um retrato sensível das turbulências na juventude; ela é, uma porta de entrada para compreendermos o cérebro que, nessa fase ainda está em transformação e pleno desenvolvimento. A neurociência é responsável por estudar o sistema nervoso e suas complexidades e nos ajuda a explicar por que essa fase da vida é marcada por características tão singulares como impulsividade, emoções intensas e uma busca constante por identidade.

Na adolescência, o que chamamos popularmente de personalidade é, de fato, um processo que está ocorrendo e se “formando” no córtex órbito-frontal, região do nosso cérebro que só amadurece completamente por volta dos 21 anos de idade.

Isso quer dizer que, até lá, ainda estamos construindo o que chamamos de ‘personalidade’, e dependendo das influências que estamos recebendo do meio, isso resulta num maior ou menor controle das decisões, planejamento e regulação emocional.

A produção da Netflix acerta ao mostrar que adolescentes não são “dramáticos” por escolha. Eles estão biologicamente programados para sentir intensamente. Para a neurociência, a partir dos 13 ou 14 anos já é possível fazer uma análise do que “eu quero” e “do que me faz bem”, mas, atendendo ainda tão somente a impulsos e prazeres imediatos. É exatamente por essa razão que a própria neurociência recomenda o uso de smartphones apenas após essa idade e, mesmo assim, com supervisão dos responsáveis.

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Estamos tratando aqui do que é fisiológico, não de questões educacionais ou religiosas. Outro ponto crucial que deve ser avaliado é o impacto do ambiente. A neurociência já comprovou que experiências vividas na infância e na adolescência moldam profundamente o cérebro.

Isso explica por que traumas, exclusões ou mesmo pequenas experiências sociais têm efeitos tão duradouros. Ao dar espaço para essas histórias, a série Adolescência ajuda a quebrar o tabu de que “é só uma fase”.

Lá vemos personagens que lidam com ansiedade, pressão social, relacionamentos conturbados e descobertas pessoais. Todos esses elementos ganham uma nova luz quando entendemos que a construção da personalidade se dá 25% por fator genético hereditário, 25% fator individual e os outros 50% são moldados pelo meio.

Mais do que entretenimento, a série nos convida a uma reflexão profunda e empática. Pais, professores e a sociedade em geral são convidados a entender que, por trás do comportamento adolescente, há um cérebro em pleno desenvolvimento sendo formado principalmente pelas interações sociais, positivas ou negativas.

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Sob a luz da neurociência, a série Adolescência não só choca e nos emociona, como também nos alerta e nos ensina, muito. E vocês pais ou avós? Estão sabendo em que realidade seus filhos e netos estão vivendo e com quais ‘verdades’ estão convivendo dentro do quarto?

Mariana Vidotto é mãe, Psicoterapeuta Familiar e Orientadora Parental, Especialista em Neurociência e Desenvolvimento Infantil, atua há 10 anos atendendo pacientes de 7 países diferentes.

[email protected]
@marianavidotto

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